segunda-feira, 18 de maio de 2009

Mais uma palhinha do meu futuro livro

Pensando em Você


Mais tarde, entre onze e trinta e meia-noite, volto para casa e toda a euforia sentida horas antes, é substituída por um sentimento sem sentido, uma estranha combinação de angústia, frustração e ausência de afeto ao chegar à estação do metrô em Forest Hills. As pessoas são estranhas e os olhares parecem tão indiferentes, que nem mesmo as lágrimas e gritos de um garoto perdido, dez anos de idade provavelmente, podem ser ouvidos. Mas quando um um velho lunático de cabelos grisalhos e aparência de mendigo grita bem alto: SOU O PROFETA E VOS ANUNCIO A GRANDE VERDADE, todos os passageiros à espera do metrô dão-lhe atenção, mas os minutos de glória do profeta dos trilhos logo acabam quando surgem dois policiais fazendo ronda. A presença dos tiras deixa preocupados dois crioulos usando correntes, colares de metais e bandanas, encostados num cartaz desbotado de um antigo espetáculo exibido tempos atrás na Broadway, olham-nos desconfiados quando por eles passam, mas seguem em frente para conter o mendigo.
Acendo um cigarro para clarear as idéias sobre as decisões que devo tomar nos próximos dias, mas como numa sala escura não vejo nada, apenas rostos, fantasmas de carne e osso à espera do expresso que os conduza de volta às suas casas. Não gostaria de voltar para casa, queria pegar uma mochila e sair sem rumo pelo mundo. Faculdade, diplomas, empregos, eram apenas um instrumento para me dar acesso ao dinheiro, necessário para satisfazer meus desejos intensos e aventureiros. O passageiro do mundo, nas ruas, nos hotéis, nas sete maravilhas e em quartos escuros com a luz da lua entrando pela janela.
O cigarro faiscando ao ser jogado nos trilhos é o sinal da chegada do metrô e aceno um não para o jornaleiro que me oferece um exemplar do The Times na esperança de um último trocado esta noite. Quando oferece às outras pessoas próximas, fico distraído tentando apenas ver as manchetes dos jornais, mas aí uma gordinha carrancuda bancando um jeito sexy com sua jaquetinha jeans e mini-saia, passa à minha frente e coloca o braço obstruindo a passagem. “Vá em frente doçura”, penso comigo. Não estou nem aí para chegar logo em casa.
Procuro um lugar vago à janela ao entrar no trem e quando os últimos passageiros embarcam, as portas se fecham e a viagem inicia.
Há pouquíssimas pessoas no vagão onde estou e é provável que em algum ponto antes de chegar ao meu destino final, fique sozinho ao lado desta janela embaçada pela umidade, perdido em meus pensamentos. E então, involuntariamente contrario o desejo mais provável, que gostaria de realizar nesta hora, desenhando um coração com o indicador e é através deste desenho na janela, que observo as paredes do túnel. Mensagens grafitadas em cores berrantes contrastam com a iluminação, enquanto sob os trilhos a toda velocidade o metrô segue levando pessoas aos seus destinos, encontros e desencontros nas paradas de estações. É algo curioso, mas sempre que volto para casa começo a pensar em você e quase sempre isso ocorre na escuridão da noite, naquelas horas tardias, quando as cabeças começam a encostar sob travesseiros e toda a vida se apresenta em videoclipes rápidos, enquanto lágrimas descem e os olhos se fecham lentamente, mergulhando na solidão e obscuridade de um sono. Preciso muito de você e não te encontro. Você estará lá em meus sonhos? Haverá poesias e sinais nas mensagens grafitadas quando o trem parar em alguma estação qualquer? Pode ser que isso ocorra e você entre silenciosamente pela porta, e quando minha cabeça inclinar-se para os lados, nossos olhares se cruzarão e imersos nesse jogo sedutor, qualquer palavra perderá sentido e então saberei que é você minha procura.
A porta se abre na próxima estação, você não entra e as mensagens grafitadas nas paredes do túnel não falam de amor, mas de anarquia, juventude, política, problemas sociais da América, e entre elas, uma no estilo Old English chama-me a atenção: A PERSEVERANÇA SEGUE POR LONGOS CAMINHOS E NOS CONDUZ AOS NOSSOS SONHOS, assinado Grape – o nome do filósofo-grafiteiro underground, sem importância para mim porque não me importam nomes, mas o que as pessoas são. Você poderia ter qualquer nome, desde o mais belo ao mais feio e mesmo assim daria rima a ele em forma de poesias e canções para tocar no violão.
A viagem segue e o metrô em movimento põe novamente meus pensamentos em ação, levando minha mente para longe, para algum lugar entre o hoje e o amanhã, entre nós, até deixar que você encontre meu caminho entre a distância e a proximidade, nos meus sonhos, nos meus pensamentos. Talvez esta noite, antes de você adormecer em sua cama e pensar nas coisas que te acontecem, o trem que me leva para casa me levará até você e ainda hoje atravessaremos as portas da incerteza, transformando tudo em certeza e então, quando seus olhos brilharem guiando-me nas esquinas escuras da grande avenida da solidão, você haverá de segurar minha mão e nós andaremos por aí, aos beijos antes da noite terminar e o dia amanhecer pondo fim ao meu sonho, levando meu coração na velocidade de um trem até me deixar sozinho na minha estação, a estação da solidão.

Um comentário:

Adriana disse...

Interessante como você descreve o cenário ao redor da personagem ao mesmo tempo em que revela um pouco do que se passa na mente e o estado de espírito dela...qual o tema central do seu livro? Essa personagem foi inspirada em você mesmo ou em alguém que você conhece?